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Октябрь
2024

Com fracasso do corte de gastos, Goiânia pode deixar de pagar folha de dezembro

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Em 6 de setembro, o então secretário de finanças Vinicius Henrique Pires Alves publicou um decreto firmando medidas orçamentárias para que a Prefeitura de Goiânia conseguisse encerrar o ano de 2024 sem rombos ou atrasos na folha de pagamento. O decreto nº 3.590 estabelece providências como a suspensão de novos empenhos para o ano, e reivindica para a própria Secretaria Municipal de Finanças (Sefin) o poder de anular empenhos pendentes “para garantir o equilíbrio financeiro”.

Na última sexta-feira, 11, Vinícius Alves se exonerou do cargo. De acordo com a nota encaminhada pela assessoria do secretário, a saída se deu por motivos pessoais, como obrigações familiares e com a sua empresa. Nos bastidores, entretanto, servidores da Prefeitura de Goiânia acreditam que seu descontentamento está relacionado à dificuldade de executar medidas de austeridade. 

Em entrevista ao Jornal Opção, um servidor da Prefeitura de Goiânia que preferiu não ser identificado descreveu como “extremamente preocupantes” as consequências do fracasso da gestão em cortar gastos. Um desses efeitos seria a incapacidade de honrar a folha de pagamento dos servidores no mês de dezembro. Existe a preocupação de que servidores podem ser prejudicados. “Medidas estão sendo tomadas, mas, para conseguir pagar a folha, é preciso cortar empenhos desde agora”.

O rombo

Documentos sobre a situação orçamentária do município explicam a origem do problema. A Prefeitura, que manteve a arrecadação dos últimos anos, corrigindo a inflação (cerca de R$ 7,1 bilhões), teve surpresas com o crescimento das despesas (R$ 6,7 bilhões no ano passado). Desde 2022, a Prefeitura faz uma readequação de vários planos de cargos e salários. Apenas os servidores administrativos tiveram aumentos com impacto de quase R$ 100 milhões para o orçamento. No total, a folha de pagamentos teve um aumento de quase 100% em relação a 2021 — hoje está em R$ 400 milhões anualmente.

Pesquisa MultiCidades, publicada em janeiro pela Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), mostra que Goiânia é o município com mais gastos públicos do Centro-Oeste. A Capital tem o pior desempenho no gerenciamento das contas públicas em 2023, de acordo com o levantamento “Finanças dos Municípios do Brasil”. Além do aumento das despesas com a folha de pagamento, contratos problemáticos continuam a se acumular. 

Em abril deste ano, por exemplo, os serviços de coleta de lixo e retirada de entulhos deixaram de ser executados pela Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) e passaram a ser de responsabilidade da Limpa Gyn. A justificativa orçamentária era de que o teto pago mensalmente à Comurg, de mais de 56 milhões, passaria a ser 19,5 milhões com a entrada do consórcio nos serviços. Entretanto, hoje, os repasses à Limpa Gyn são de cerca de R$ 20 milhões, mas a Comurg permanece recebendo repasses de cerca de R$ 46 milhões — em outras palavras, houve multiplicação dos gastos em vez da economia esperada. 

Falta de comando

O advogado Juliano Gomes Bezerra participou de todas as gestões de Iris Rezende, como diretor de fiscalização e controle, membro da Secretaria Municipal de Planejamento e Urbanismo (Seplam), controlador-geral do município de Goiânia, entre outros. O técnico viveu crises como a de 2005, quando Iris Rezende assumiu a Prefeitura com a folha de pagamentos de dezembro da gestão anterior em aberto, e a crise de 2017, quando o problema se repetiu. Em ambas ocasiões, o prefeito do MDB teve de parcelar pagamentos pendentes da gestão anterior. 

Sobre o problema da irresponsabilidade fiscal que leva ao não pagamento da última folha da gestão, Juliano Bezerra afirma: “Gestores como Iris Rezende têm credibilidade na palavra dada. Na última gestão de Iris, tivemos um déficit de quase R$ 50 milhões ao mês. O prefeito ordenou o ‘fechar das torneiras’ de forma organizada — ele disse o que era prioritário e o que deveria ser cortado; não dependeu da vontade de técnicos. Quando o gestor não conhece a máquina pública, ele é pautado pelos técnicos, e não o contrário.”

Quando o gestor não conhece a máquina pública, ele é pautado pelos técnicos, e não o contrário

Juliano Bezerra: “O capitão do navio deve saber comandar a embarcação, e não depender do marinheiro” | Foto: Reprodução 

Juliano Bezerra é cético quanto à ideia de que o prefeito pode ser leigo, desde que aponte especialistas para as secretarias. “Quando o gestor chega ao cargo em uma situação complexa como a que temos, há uma quantidade enorme de informações para ponderar. Não se trata apenas da folha de pagamentos da prefeitura: ele terá de negociar com o Imas, com a Comurg, as maternidades — todos esses têm valores a receber, e essa negociação só funciona se a palavra do prefeito tiver credibilidade. O capitão do navio deve saber comandar a embarcação, e não depender do marinheiro.” 

A dependência cega da opinião de subalternos gera problemas como os que Goiânia atravessa hoje, diz Juliano Bezerra. “Os servidores tinham essas demandas salariais que são legítimas. Alguém afirmou ao prefeito que deveriam ser atendidas e ele se deixou ser guiado. A demanda pode ser justa, mas a questão é como se atende — é preciso saber atender a todos gradativamente, conhecendo as capacidades da Prefeitura. Agora, chegamos à situação em que o governo municipal teve de contrair empréstimo de R$ 710 milhões, porque não conseguiria pagar as obras que foram feitas e a folha, que aumentou toda de uma só vez.”

Folha de pagamento

Um funcionário da Prefeitura de Goiânia, que prefere não ser identificado, descreve em termos concretos a falta de controle sobre o orçamento que deu origem ao déficit da Prefeitura. “Temos uma Lei Orçamentária Anual (LOA) que foi aprovada e prevê um orçamento. Mas existem modalidades de contrato, como aquelas com as maternidades, que funcionam sob demanda — há um empenho estimado, mas, caso sejam emitidas mais ordens de serviço do que o previsto, a Sefin tem de pagar. O que aconteceu em Goiânia foi a antecipação dos gastos do ano, de forma que podem faltar recursos do tesouro para terminar de pagar a folha.”

A Sefin emitiu alertas para todas as secretarias, mensalmente. “Mas a Secretaria de Finanças não faz gestão; se a ordem de serviços é emitida lá na ponta, o valor precisa ser liquidado.” Alguns recursos, como os destinados para execução de programas da Educação e Saúde, vêm do governo federal, e são “carimbados” (com usos determinados). Por isso, a dívida aparece na folha de pagamentos, cujo fundo administradores podem antecipar para outros usos. 

Sem a proibição expressa de execuções sem empenho, a Sefin se torna apenas uma regularizadora dos gastos de outros órgãos. Servidores indicados na Prefeitura podem receber um ‘não’ da Sefin, mas decidem prestar ou contratar serviços de terceirizados mesmo assim. Sem processo de contratação, empenho ou liquidação, a Secretaria não pode atestar que o serviço foi prestado ou que era necessário.

Na opinião deste servidor, existe uma solução simples para a crise, mas que depende de um gestor capaz de impor medidas como as previstas no decreto nº 3.590. “Falta a proibição da execução de contratos sem empenho. Caso contrário, o que a Finanças pode fazer? Nada”. Para garantir que não haverá furos no tesouro, toda despesa de alto valor tem de ter autorização prévia, conclui.

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