Até Pablo Marçal põe o dedo na cara do Supremo
Esqueçam as lacrações que o próprio Pablo Marçal define como idiotas e prestem atenção no que importa. O que interessa agora é que o sujeito se apresentou no Roda Viva como candidato a protagonista do cenário nacional.
O ex-coach elevou o padrão dos seus recados e ergueu o dedo, olhando para a câmera, na direção de Alexandre de Moraes. Leiam o que ele disse, apenas parecendo que falava de forma genérica contra o Supremo.
Vamos pôr em ordem a sequência de lacrações, para facilitar o serviço. A primeira frase: “Por favor, Congresso Nacional, se levantem”. A segunda: “O Supremo está muito político”.
A terceira: “Com todo respeito aos 11 togados na Suprema Corte, esse é um recado meu pessoal para vocês. Já passou essa onda. O Brasil precisa ser unificado, a gente precisa baixar essa pressão”.
A quarta lacração: “Não precisamos ter uma corte política. Vamos voltar a defender a suprema carta, a nossa Constituição Federal de 1988. Ela precisa ser defendida por vocês. Não precisa legislar nem atuar politicamente”.
A quinta lacrada, essa dirigida ao Senado: “Faço aqui um clamor aos 81 senadores. Se o povo está dizendo o que precisa ser feito, que vocês assumam aquilo que o povo tá falando. Que vocês se levantem”.
Marçal fez as lacrações depois de vacilar um pouco, diante das provocações da bancada de jornalistas. Parecia não querer criticar Moraes. Aplicou alguns dribles, mas no fim falou em direção à câmera dando recados ao ministro.
Não citou seu nome, porque qualquer idiota entenderia, mas fez referências ao vazamento de informações trocadas entre assessores de Moraes, no caso que a Folha tentou transformar no escândalo do desrespeito aos ritos.
Queixou-se dos prejuízos com a retirada do X do ar. E chegou a sugerir que o Conselho Nacional de Justiça investigue o ministro, mesmo que o CNJ não tenha autoridade para tanto.
O candidato do PRTB disse três vezes que o Senado (citado uma vez como Congresso) precisa se levantar e repetiu duas vezes que estava dando um recado direto aos ministros do Supremo.
Não estava fazendo alertas à mais alta corte do país na condição de coach, porque se nega a ser definido como tal, mas como “jurista com cinco anos de academia” e como educador.
O jurista Marçal entrou na arena já lotada pelas matilhas que cercam Moraes, dando voltas que pareciam direcionar seus ataques a todo o STF. Mas o alvo prioritário era ululantemente Moraes.
Teve o cuidado de amarrar as lacrações com o conselho ao Senado, para que ouça o povo, com o detalhe da mão no ouvido. Um pedido feito na forma de clamor aos políticos que têm o poder de dar encaminhamento ao impeachment de Moraes.
Marçal quer o impeachment? Não, de jeito nenhum, porque disse já ter muitos inimigos e não pode enfrentar o Supremo, não agora, mas mais adiante, como você verá ao final desse texto.
Diante do questionamento de Malu Gaspar, do Globo, se estava defendendo a cassação de Moraes, esclareceu: “Quem defende o impeachment é o Senado”. Ele, de forma alguma.
Foi também como jurista que deu uma aula aos jornalistas, falando da cassação de Dilma Rousseff pelo Congresso, para acentuar que um impeachment é um processo “político-jurídico”.
Para encerrar, aí vai a última lacração, com mais um dedo na cara de Moraes e do STF: “Daqui a 35 dias eu tô eleito prefeito da cidade de São Paulo, e aqui vou mandar um recado para a suprema corte. Vamos fazer uma política diferente, não dá pra ser desse jeito. Se não, a gente vai atrapalhar o crescimento desse país”.
Não precisa traduzir, mas esse é o alerta: com o poder de prefeito de São Paulo, o ex-coach poderá orientar o STF a não continuar agindo desse jeito. Porque seu projeto é nacional.
Foi interrompido pela mediadora Vera Magalhães e só assim parou de mandar recados já em tom de ameaça. Se não tivesse sido alertado de que estava passando dos limites, continuaria atacando. Até onde?
Foi esse um dos poucos erros de condução da entrevista. O momento em que a mediadora tirou o embalo de Marçal, que parecia caminhar em direção a um precipício. Carregando Bolsonaro nos braços.
*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Editora Diadorim).
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